27 de julho de 2010

Pérola Pernambucana *









Sábado, 2 de agosto de 2008


   Era a terceira vez que aquele substantivo e aquele artigo se encontravam no elevador. Um substantivo masculino, com um aspecto plural, com alguns anos bem vividos pelas preposições da vida. E o artigo era bem definido, feminino, singular: era ainda novinha, mas com um maravilhoso predicado nominal.
   Era ingênua, silábica, um pouco átona, até ao contrário dele: um sujeito oculto, com todos os vícios de linguagem, fanáticos por leituras e filmes ortográficos. O substantivo gostou dessa situação: os dois sozinhos, num lugar sem ninguém ver e ouvir. E sem perder essa oportunidade, começou a se insinuar, a perguntar, a conversar.
  O artigo feminino deixou as reticências de lado, e permitiu esse pequeno índice. De repente, o elevador pára, só com os dois lá dentro: ótimo, pensou o substantivo, mais um bom motivo para provocar alguns sinônimos. Pouco tempo depois, já estavam bem entre parênteses, quando o elevador recomeça a se movimentar: só que em vez de descer, sobe e pára justamente no andar do substantivo. Ele usou de toda a sua flexão verbal, e entrou com ela em seu aposto.
  Ligou o fonema, e ficaram alguns instantes em silêncio, ouvindo uma fonética clássica, bem suave e gostosa. Prepararam uma sintaxe dupla para ele e um hiato com gelo para ela. Ficaram conversando, sentados num vocativo, quando ele começou outra vez a se insinuar.
  Ela foi deixando, ele foi usando seu forte adjunto adverbial, e rapidamente chegaram a um imperativo, todos os vocábulos diziam que iriam terminar num transitivo direto.
  Começaram a se aproximar, ela tremendo de vocabulário, e ele sentindo seu ditongo crescente: se abraçaram, numa pontuação tão minúscula, que nem um período simples passaria entre os dois. Estavam nessa ênclise quando ela confessou que ainda era vírgula; ele não perdeu o ritmo e sugeriu uma ou outra soletrada em seu apóstrofo. É claro que ela se deixou levar por essas palavras, estava totalmente oxítona às vontades dele, e foram para o comum de dois gêneros.
  Ela totalmente voz passiva, ele voz ativa. Entre beijos, carícias, parônimos e substantivos, ele foi avançando cada vez mais: ficaram uns minutos nessa próclise, e ele, com todo o seu predicativo do objeto, ia tomando conta.
  Estavam na posição de primeira e segunda pessoa do singular, ela era um perfeito agente da passiva, ele todo paroxítono, sentindo o pronome do seu grande travessão forçando aquele hífen ainda singular. Nisso a porta abriu repentinamente. Era o verbo auxiliar do edifício. Ele tinha percebido tudo, e entrou dando conjunções e adjetivos nos dois, que se encolheram gramaticalmente, cheios de preposições, locuções e exclamativas. Mas ao ver aquele corpo jovem, numa acentuação tônica, ou melhor, subtônica, o verbo auxiliar diminuiu seus advérbios e declarou o seu particípio na história.

  Os dois se olharam, e viram que isso era melhor do que uma metáfora por todo o edifício. O verbo auxiliar se entusiasmou e mostrou o seu adjunto adnominal. Que loucura, minha gente. Aquilo não era nem comparativo: era um superlativo absoluto. Foi se aproximando dos dois, com aquela coisa maiúscula, com aquele predicativo do sujeito apontado para seus objetos. Foi chegando cada vez mais perto, comparando o ditongo do substantivo ao seu tritongo, propondo claramente uma mesóclise-a-trois. Só que as condições eram estas: enquanto abusava de um ditongo nasal, penetraria ao gerúndio do substantivo, e culminaria com um complemento verbal no artigo feminino.
  O substantivo, vendo que poderia se transformar num artigo indefinido depois dessa, pensando em seu infinitivo, resolveu colocar um ponto final na história: agarrou o verbo auxiliar pelo seu conectivo, jogou-o pela janela e voltou ao seu trema, cada vez mais fiel à língua portuguesa, com o artigo feminino colocado em conjunção coordenativa conclusiva.

Observação:
  Não tenho informações do título e da autora do texto, este texto é uma redação feita por uma aluna da UFPE - Universidade Federal de Pernambuco (Recife), que venceu um concurso interno promovido pelo professor titular da cadeira de Gramática Portuguesa, não mudei a estrutura e nenhuma palavra do texto.

21 de julho de 2010

Confusa conclusão

Hoje, parei para olhar a lua e me peguei pensando em ti.
Você que não tem nome, rosto ou forma em minha memória,
ou será que tem e não reconheço isso?
É, senti saudade de um passado em que eu era amada
simplesmente pelo que eu era.
Lembrei de um tempo que somente a sua presença, o seu jeito,
seu carinho, sua amizade me preenchia.
Agora esta tudo tão longe, embaçado e confuso demais pra entender.
Pois é, não acho um só erro nisso além da omissão, prefiro não comentar,
fugir do assunto ou negar, se necessário.
Prefiro reconhecer isto só no meu íntimo, e particular coração.
A saudade, a ausência e a dúvida, ainda são as três melhores companhias.
Porque a ausência de ti tem sido mais interessante e mais intensa de viver
que  a covarde solidão que a mim reservo.



Lilian Veríssimo Marinho



   

15 de julho de 2010

Tudo novo, de novo

    Olá, você está interessado nesse imóvel? Deve ter visto nosso anúncio, estamos à procura de gente boa e honesta, em primeiro lugar.
    Não querendo falar dos antigos moradores, mas já falando, preciso dizer que foram tarde... Graças a Deus, a probezinha não agüentava mais tanta loucura e maus tratos ao mesmo tempo.
    Exagero? Queria eu estar exagerando... Bendita hora que foram embora, enfim esvaziou-se a casa... Como dizem por aí, “melhor vazia, que mal habitada”!
    Largaram para trás um monte de tralhas, coisas usadas, fotos, lembranças de um passado muito do mal criado, jogamos tudo fora.
    Os ex moradores dessa casa eram burros demais, nunca souberam o verdadeiro valor de uma casa simples, pequena e jeitosinha, viviam de querer fazer obras e mais obras, uma barulheira infernal, tudo era motivo de mudança geral.
  Veja bem, vou lhe descrever como era a casa antes desses animais desastrados passarem por aqui, antes de transformarem aquela coisa linda, numa coisa mal assombrada.
   A casa sempre foi pequena, tinha um jardim lindo, repleto de notas musicais, flores e borboletas, tudo em tons suaves, destacando as cores mais chamativas como pequenos e delicados detalhes... Esses antigos moradores já chegaram estragando tudo!
   Trouxeram sentimentos infantis, e nós sabemos como são as crianças: destroem tudo, porque acham que tudo é brinquedo e que dá para comprar outro a qualquer momento!
  Nos fundos, havia um pomar, dali tirava-se tudo o que fosse necessário para fazer qualquer tempero caseiro, e tudo que se fazia ficava com um gostinho peculiar que só a comida caseira tem, porém mais uma vez os sentimentos infantis atacaram, brincaram de comidinha com tudo, acabaram destruindo o pequeno pomar, daí a comida começou a ficar sem gosto, até chegar ao ponto de já sair do fogo azeda.
  Aqui por dentro, nossa, como era diferente! Aqueles loucos confundiram tudo, colocaram a cozinha na sala, os quartos nos banheiro, o banheiro na cozinha e a sala nos quartos, fizeram obras de grande custo, sim nós permitimos, mas só serviu para tirar tudo do lugar.
   Os resultados? Você quis dizer as conseqüências, não é? Tudo foi aparecendo aos poucos, primeiro a casa ficou pálida, depois as flores foram morrendo e junto com isso, as borboletas foram embora, os tons de cor suave ficaram acinzentados, e as notas músicas lembravam mais uma marcha fúnebre, não sobrou nada de alegre na fachada.
  O pomar dos fundos foi detonado, como eu disse, além das crianças destruirem as plantas, os moradores não cuidavam das mudas como devia, aos poucos foram ficando menos saborosas e morreram, por isso a comida ficou pior. 
  Eles mudaram tudo por dentro, além disso não permitiam que “estranhos” entrassem, fecharam a casa para qualquer visita, e ao menor sinal de aproximação do portão, soltavam cães raivosos, com cede de sangue... Colocaram umas grades com arames enfarpados, também. Até nós, que vínhamos pegar nossa quantia mensal, escolhemos que pagassem por depósito, aprendemos a temer os antigos moradores dessa casa.
   Nossa! Por favor, me perdoe... Mas não deu para segurar as palavras diante das atrocidades que foram feitas a essa beleza de imóvel, uma enorme crueldade!
  Enfim, a casa é isso aí que você está vendo, fizemos muitas obras para que ela voltasse a ser o que era, mas depois da primeira mudança, nada fica como era originalmente, por mais árduo que seja o trabalho de quem está restaurando o imóvel.
  Os cômodos estão no lugar e o jardim está renascendo, ainda são pequenas mudas, mas quando começarem a florescer, você verá que maravilha fica isso aqui ao amanhecer, e é mais lindo ainda ao entardecer (sussurro: é quando aparecem as borboletas, cada uma mais linda que a outra).
 As notas musicais ainda estão se ajustando ao novo cenário, passaram muito tempo acompanhando dor e sofrimento, toda essa alegria é novidade, mas como você está podendo notar, a melodia já está bem agradável.
  O pomar? Sabia que você faria essa pergunta, todos fazem... O pomar já está bem adubado, pronto para receber novas mudas de tempero, dos mais variados e que sejam do gosto do novo morador.
  É, quanto a isso, fizemos uma pequena mudança... Todos os moradores que vieram para cá, encontraram o “canteiro de temperos” pronto, e apenas usufruíram de cada um deles, até que morriam ou acabavam, por isso faremos diferente... O novo morador tem o direito de plantar exatamente tudo o que gosta para temperar sua comida, não vamos “impor” nossas preferências, dessa forma nós acreditamos que não acontecerá mais a catástrofe de acabar tempero, comida azedar, essas coisas corriqueiras, porém incomodas.
  Preço? Não trabalhamos com valores monetários, mas amor, dedicação, atenção, carinho, fidelidade, amizade, já seriam um bom sinal.
  Nossa única exigência é que não saiam quebrando, destruindo, desorganizando tudo novamente, imagino que não faça idéia do trabalho que dá para tentar colocar tudo no lugar, então por favor, pode mudar umas pequenas coisas, mas com muito cuidado... Fora isso, tudo ok!
  Vamos voltar lá pra fora? Essa hora costumamos fechar as cortinas para o Sol não estragar o clima aconchegante do entardecer aqui dentro.
   Bem... Essa é a casa, está bem como anunciamos, não é das melhores do mundo, mas temos certeza que irá atender as suas necessidades, e contanto que você não tenha muitas crianças, o jardim vingará, o pomar também.
   Então, quer se mudar para cá? 

Andrezza Mascarenhas  

11 de julho de 2010

Flor de Inverno

Delicada demais, 
porém escandalosamente chamativa.
Assim é a flor de inverno, 
exuberante e frágil.
Pelo fato de resistir ao frio, 
todos pensam que é forte.
Enganam-se, é frágil demais.
Se protege no gelo.
Aprendeu a guardar-se no frio, 
porque o calor queima.
Aprendeu a guardar-se no frio, 
porque o calor seca.
Sua beleza é tão delicada quanto sua resistência!
Não é uma flor para qualquer jardim, 
precisa de amor.
Um amor quente, 
mas que não derreta seu apego ao frio.
Flor que nasce no inverno, 
aprende a viver arduamente.
Sobreviver em meio tantos infortúnios naturais, 
é heroísmo.
Sua força vem da terra, 
de suas raízes, onde ela foi germinada.
Aprende a tirar da terra, do ar, 
do Sol e da Lua o que precisa.
Sabe viver sozinha, 
mas precisa de companhia para florescer.
A flor que nasce no inverno, 
sente-se mal no verão.
Ela nasce no inverno porque gosta de aconchego, 
calor separa.

Ela prefere o frio porque o calor faz suar, 
e flores sempre cheiram bem.
Gosta de ser mimada, o frio do inverno 
já lhe é suficiente para esfriar os sentimentos.
Flores de inverno não são muito racionais, 
são intensas, coloridas.
Precisam de cor, o inverno é meio "preto e branco", 
deixa tudo discreto.
Flores de inverno gostam de se destacar.
Por isso sempre são coloridas, enormes.
Elas se protegem no frio, mas por dentro
 queimam uma chama ardente valiosa.
Chama ardente, e difícil de ser extraída.
Demanda conhecimento, cuidado.
Flores de inverno não são complexas, 
mas tornam-se complicadas aos imbecis.
Elas não murcham nunca, 
mas sangram por dentro.
Recorrem a terra, as raízes.
Porém 15 dias depois já estão exuberantes, 
e possuem memória fraca.
Uma flor de inverno adora ser acariciada, 
carinho de criança, delicado e infantil.
Pétala por pétala, ela vai se entregando, 
e quando vê já está tomada até o caule.
Flores de inverno viram plantas carnívoras 
se ameaçarem suas raízes, sua terra.
Jamais trocam de vaso, ainda que pequeno e humilde, 
só porque ele é pequeno e humilde.
Elas escolhem onde querem germinar, 
e ali só precisa ter amor, verdade, e risadas.
Flores de inverno jamais estão à venda, 
não há preço que valha uma muda dessas.
Para conseguir a sua, é bem mais simples, 
não precisa de dinheiro, presentes, nada.
Basta apenas saber conquistar a confiança 
desse ser amante do frio, da mansidão.
A parte isso, ela mesmo nascerá no seu jardim 
e lhe dará os seus mais belos ramos.
Flores de inverno nascem no frio, 
porém com a missão de aquecer aqueles que ama.

Andrezza Mascarenhas 

6 de julho de 2010

Cidade (não tão) Maravilhosa

    A semana havia começado a apenas dois dias, era um dia comum no Rio de Janeiro, o Sol estava castigando aqueles que humildemente ousavam a se arrastar debaixo de sua calorosa majestade, praticamente insuportável.
    Por volta das 13h, ela se deslocava de onde estava para poder procurar algum lugar com ar refrigerado para comer e descansar, o dia estava apenas pela metade, a ainda havia mais com o que gastar energia, embora talvez não houvesse nela energia suficiente para isso.
    Enquanto almoçava, ela pensava o quanto seria difícil chegar até a noite sem nem 15 minutos de cochilo, mas sabia que não haveria remédio, como todos os últimos 90 dias de sua vida, aquele não seria mais curto que os outros, nem menos cansativo, o que ela não sabia é que o destino havia resolvido mostrar-lhe um pouco mais de realidade.
    Por volta das 17h ela ouve barulhos de tiro, muitos tiros sendo disparados... O motorista do ônibus em que ela se encontrava decidiu percorrer outro caminho, um pouco mais afastado da mira das metralhadoras e armas potentes do que pode ser considerado legal e do que pode se considerado ilegal... Naquele momento ela sentiu medo, pena, raiva, vontade de gritar, mas a frustração de não poder fazer nada em relação aquilo naquele momento, fez que houvesse um silêncio, silêncio geral... Ninguém falou nada! O que mandava naquele momento era o medo, o pavor, a violência e a morte.
    Por mais desviado que fosse o caminho, as vezes no Rio de Janeiro, não existem muitos lugares que possam servir como desvio, e o motorista teve que passar perto demais daquela confusão... Haviam corpos, corpos de pessoas, seres humanos, jogados no chão, desprezados... Certos ou errados, ninguém ali teve uma segunda chance, ninguém mereceu ser perdoado... A lei e a contra-lei estavam em confronto mais uma vez, morriam inocentes, culpados... Quanto sangue havia naquele chão! Quantos gritos cabiam naquele momento!
    "Desse ponto de vista, a cidade maravilhosa nem é tão maravilhosa assim", pensou ela, com medo, com pena... Sem perceber, já haviam passado 01h30min do momento em que a confusão havia começado, todos estavam atrasados, inclusive ela, mas ninguém na verdade prestava atenção nesse detalhe, o que importava era sair dali.
    A partir daquele dia, ela que amava a cidade onde mora, passou a temê-la, e já não olha para o alto com a mesma naturalidade, pensa que sempre pode ouvir os mesmos barulhos, ver as mesmas manchas de sangue, sentir o mesmo medo.




Andrezza Mascarenhas

Adeus Lady

   Dia 26 de dezembro de 1995 ela chegou, eu que sempre fui muito mimada, dormi chorando porque a promessa feita pelo meu pai foi que ela chegaria na manhã do dia 25, no Natal.
    Ela não era branquinha como eu havia pedido, e eu acordei com seus gemidos de filhote... Nem liguei para a mudança da cor, era a coisa mais linda, peluda e gorda que eu já havia visto em toda a minha vida, os olhos dela brilhavam de verdade e ela veio correndo brincar comigo.
    Eu sempre fui muito alérgica, mas mesmo assim era comigo que aquela bolinha de pêlo dormia... Seu nome ia ser Pretinha, mas a minha bábá na época era apaixonada pelo ridículo do Roberto Carlos, e ficava cantando "Lady Laura" a tarde toda... Umas três semanas depois que aquela coisa linda chegou, eu decidi chamá-la de Lady.
    Logo de começo ela já nos deu um susto! Antigamente a vacina que hoje é dada em três doses, era dada de uma vez só e o filhote precisava ter 3 meses completos, mas a Lady não tinha nem 45 dias, e a gente não sabia (assim como só ficamos sabendo que ela não era Toy quando ela ficou enorme, rs), o veterinário estranhou o tamanho dela, a ausência de dentes, mas ainda assim aplicou a vacina, Marcelo, o nome da criatura! Lady não reagiu bem, pensamos que ela ia morrer, mas ela ainda tinha uma missão a cumprir aqui, e resistiu a pancada da vacina precoce (minha mãe dava papinha, leitinho, mucilon, etc etc etc).
   O tempo foi passando, a Lady foi crescendo e foi se mostrando uma cadela ímpar! Ela era super inteligente, só faltava falar, como dizia a maioria dos meus familiares... Ela sabia abrir porta, sabia pedir comida, sempre fez sujeira no jornal, se não tivesse jornal, ela pedia pra ir a rua... Era a cadela perfeita... Mais ainda quando eu fazia besteira e minha mãe vinha com o chinelo, e ela se metia no meio e mostrava logo os dentes, rs.
    Uma vez minha mãe viajou (isso era bastante comum), e eu sentia muito a ausência da minha mãe a ponto de ter febre emocional... A Lady ficou comigo a noite toda, sentada no chão e com a cabeça apoiada na cama, como ela costumava fazer quando observava alguém deitado.
    Eu sempre disse que a Lady era a cachorra da minha mãe... Ela sentia uma paixão pela minha mãe, a ponto de chorar quando ia dando a hora dela chegar e ela não chegava... Ela sentia meu cheiro do portão quando eu estava chegando da escola, corria para avisar a minha mãe ou a minha bábá... E foi ela a grande culpada do meu pai saber que eu beijo na boca, rs... Eu disse que ia na esquina comprar sanduíche e demorei um pouco, meu pai saiu com ela para me procurar e ela o levou exatamente onde eu estava, beijando.
    Infelizmente, nada na vida é eterno e as coisas boas parecem que acabam mais rápido! Aos pouquinhos minha poodle preta super inteligente foi ficando velha, perdendo os dentes, teve dois tumores (um na mama e outro no útero), e por fim ficou senil e com vários tumores no cérebro... Parecia perdida, não era mais a minha bolinha de pêlo animada, super inteligente e carinhosa, era um esqueleto coberto de pele que transitava pelo espaço que conseguia dando com o focinho em tudo pela frente.
    Depois de várias convulsões, paradas cardíacas e massagens no peito feitas pelo Diego, no dia 12 de março de 2O1O, eu e meu pai saímos de casa para levá-la para sacrificar, mas eu e ele somos dois frouxos e escolhemos cuidar dela com os remédios que o veterinário passou... Ela brigou sexta, sábado, domingo e na Segunda-Feira, dia 15 de março de 2O1O, minha mãe a encontrou morta na área aqui de casa, mas ela não sofreu nada para morrer, porque não estava suja.
    Algumas pessoas podem me achar uma completa imbecil por chorar, sentir saudades e sofrer pela perda da minha cadelinha, mas ela a mim foi mais fiel, amiga, companheira que muitos seres humanos... A Lady nunca foi apenas uma cadela, ela sempre foi parte da nossa família.
    Se eu pudesse dizer algo que ela pudesse entender, eu diria "obrigado, você me mostrou que amor se sente e não precisa ter explicação, eu te amo", mas infelizmente eu chorava tanto que nem "adeus" eu consegui dizer.
    Agradeço ao meu pai, minha mãe, ao Diego, a tia Inês, ao Thiago, a minha irmã e a todos que me ajudaram em um dos dias mais difíceis da minha vida, o dia em que eu dei adeus a mais que uma cadela, a mais que um corpo, o dia em que eu dei adeus pra sempre a uma melhor amiga.

Andrezza Mascarenhas

"cuide bem do seu amor, seja quem for"

5 de julho de 2010

Desapego

    Se caminho e apago minhas pegadas, é porque não quero ser seguida... Trago comigo lembraças e pessoas que me convém, e aquilo a que não tenho apego, desprezo.
  Sou tão livre quanto o vento, as vezes até mais do que ele... O que nos diferencia, é o simples fato de eu ter uma necessidade constante em me prender, 5 minutos depois, em me soltar... Ainda em sentido de igualdade, faço enormes estragos ou, suaves e delicados carinhos, de acordo com a minha intensidade, que ainda não consegui controlar com perfeição. 
    Não que eu seja uma desgarrada, é que o mundo é muito grande, e ainda não cabe na palma da minha mão... Lá sabe Deus se um dia caberá... O que me prende aqui, é o amor... E este é o mesmo que me liberta... Não de grandes males, e nem de grandes correntes... É esse imenso e justo amor que me liberta de mim, e me permite viver.




Andrezza Mascarenhas